segunda-feira, setembro 20, 2010

plato would understand me.

Eu estava hospedado em um hotel de frente ao mar num dia em que se misturava o cinza e o azul do oceano no céu. Havia passado a noite no hotel e me acordei com um escândalo sexual que ocorrera pela manhã. Envolvia o gerente do hotel e eu.

Saí do hotel como uma mulher às pressas tentando cobrir suas partes íntimas e ao mesmo tempo se vestir, o que foi fracassado, pois ao sair, me deparei com um grupo de pessoas que se encontravam à beira do mar para viajarem atrás do seu eu interior, pessoas muito variadas. Lá estava um homem, que era o líder, cuja força desafiava a ciência. Ele nos levaria até o habitat onde nossas verdades secretas estavam escondidas, colocando algemas douradas em seus pulsos e nadando na velocidade da luz.

Fomos em direção ao mar, que era lá onde nossa aventura começaria. Nadamos, e quando chegamos a um determinado ponto, todos deram as mãos, formando um círculo de proteção onde a água não nos afogaria. Passamos por vários barcos afundados, várias salas de jantar, cozinhas, locais onde reis e rainhas transitaram e vimos os mais lindos talheres e enfeites que podíamos ver. Era tudo muito pequeno e delicado, mas, além disso, havia alguns bibelôs que tinham um formato nada convencional, eram bibelôs no formato de pênis. Esforçava-me para levar algum, mas algo me dizia não, pois cairia do círculo e morreria afogado, logo eu dizia a todos que não queria levar nenhuma lembrança.

Chegamos a um local deserto do oceano, habitado apenas por corais e poucos peixes que ali procuravam algum vestígio de comida, mais para o lado do oriente. Estávamos submersos no fundo do oceano e tínhamos contato com nada além de nós mesmos. Era o que eu achei. Lá, no fundo do mar, há milhares de quilômetros abaixo do solo terrestre, se encontravam não somente eu e o grupo, mas o gerente do hotel que eu estava hospedado. Ele havia feito uma lista com todos os meus defeitos e mostrado não só pra mim, mas para quem quisesse escutá-los. Havia em torno de oito a dez defeitos, mas o que me lembro com mais nitidez, era que eu era interesseiro. Ele disse: “Você, Flávio, é todo bonzinho quando quer alguma coisa, mas depois que a consegue, fica frio e estranho!”. Eu entendia o que ele queria dizer, mas me revoltei rebatendo: “E qual é o problema em me esforçar ao dobro para conseguir algo que eu quero? Isso só deveria ser algo bom.” Houve uma longa pausa e ele sorriu. Como foi bom me defender de mim mesmo, embora eu não fosse ele, era como se ele fosse eu. Foi como dizer “Foda-se, Flávio crítico.” Mas como não pude dizer isso a mim mesmo, disse a ele o que foi tão bom quanto. Senti que uma parte de mim havia se encaixado com aquele defeito apresentado, não com o defeito em si, mas com a minha postura ao tentar ver uma qualidade em um defeito e, além disso, aceita-lo.

Depois de tanta clareza, fui dormir. Ao acordar, parecia que outros grupos haviam chegado ao lugar em que estávamos para se encontrarem também. Comunicamo-nos com duas mulheres à nossa frente e as convidamos para almoçar conosco. Trouxeram um prato típico do Afeganistão que era delicioso, mas antes de terminar de comer, a comida virou pedra e havia sido tomada de mim. “O almoço acabou” exclamava uma voz grossa e tempestuosa. Agradeci as duas pela comida e voltei a dormir. Tive um sono longo e renovador, mas tive que acordar com choros e luto, pois uma cantora que estava em nosso grupo, havia sido envenenada na outra noite. Chorei como um recém-nascido querendo o toque de sua mãe. Perguntei quem a tinha envenenado e disseram: “O cavalo. Que é você.” Fiquei então inconsolável até que me explicaram que a carne de cavalo que ela me pedira para passá-la, estava estragada. Fiquei menos mal, mas queria de todo jeito sair daquele lugar. Questionei-me o que aconteceria se eu acordasse, foi quando começou a entrar água dentro do círculo e não conseguia mais respirar. Em todo aquele tempo, eu imaginava estar ao ar livre, mesmo sabendo que estavam dentro do oceano, mas abrir os olhos daquela forma me fez ver que estávamos dentro de ostras marinhas e despertar daquela forma, havia a aberto. Mas ela havia batido então tivemos que nadar até outra. Nesse meio tempo, me forçaram a ler uma revista de colunas sociais para que a ostra pudesse se abrir e fechar novamente. Percebi então que ali era o mundo das ideias de Platão e toda aquela verdade me incomodava ao ponto de eu querer voltar para o mundo de mentira.

Amanheceu e eu podia ouvir minha mãe me chamar. O céu estava azul anil e podia me ver saindo do mar e voltando para o mundo imaginário ao som dela me chamando para almoçar.

Nenhum comentário: